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A poesia de Daniel Conrade é simples, desprovida estilo poético, mas busca a profundidade do Ser e da Vida. A maioria dos seus textos foram feitos para serem lidos em silêncio, pois o poeta acredita que do silêncio seus poemas vieram, não sendo muito compatíveis a recitais e leituras exclamáticas.

 

Conheça aqui alguns dos seus poemas:

 

 

 

ÁGUA

 

Essa quem vos fala, sou eu...

Pura, suja, doce e, ao mesmo tempo, temperada pelo sal.

Sou nuvem, sou navegável,

sou de lastro e sou de arrasto...

Tempestuosa. Calma. Fria das formações rochosas.

Limbo das folhas e limo.

Sou quem corta os teus caminhos,

sou quem acaricia e apaga os teus rastros.

 

Sou quem te reflete, Narciso!

Sou quem te ensina.

Eu sou doce,

água doce,

sou docente.

Sou idosa,

mulher e adolescente.

Sou tua lágrima e tua saliva.

Sou teu esgoto e tua nascente.

 

Sou quem te afoga e afaga, Narciso!

Você nasceu mergulhado em mim.

A cada dezesseis segundos morre um filho teu

por um copo de mim.

Sou as cataratas e as meninas dos teus olhos sedentos...

Sou a gota que tu sabes

e  o oceano que tu ignoras.

Sou quem lava a tua maquiagem

e quem marca as margens nos papéis da tua estória.

 

Para amar, Narciso, feche os olhos. E abra-os para o mar.

 

 

© Daniel Conrade, 2009.

 

--

 

 

RIO

 

Além das lentes,

além dos olhos,

além da mente.

Além da curva adjacente.

 

Ser um rio,

ser chuva,

ser peixe,

ser mar

e ser nascente.

 

É um fio,

é corda,

é feixe.

É vento,

é folha

e é corrente.

 

É um raio,

é a esfera.

É seixo,

é areia,

é terra

e é semente.

 

Se eu me perdi a margem,

foi porque precisava de ar.

Estar perto de si, longe de ser

um náufrago esperando alguém voltar.

 

© Daniel Conrade, 2008.

 

--

 

 

VELAR

 

 

A

vela

ascende.

Se não

velar

 

incendeia.

Opavioélongomesmo (...)

O fósforo, já foi?

A chama dança

por falta de ar

dentro do copo,

mesmo aberto

e transparente.

A chama da vela

dança por qualquer

movimento do ar,

transeunte e

intransigente.

A vela apaga de qualquer maneira.

Aprender é luz. Basta saber

aonde a vela levar.

 

 

© Daniel Conrade, 2010.

 

--

 

 

COLCHA DE RETALHOS

 

Retalhos de papel. Papel para poesia.

Primeiras e últimas, as palavras se recolhem.

Pedem para não serem ditas.

As folhas caem como as do calendário,

não passam em branco,

pedem para serem escritas.

Folha após folha amarelada que um dia fora branca,

que um dia fora verde.

Que se jogaram aos ventos,

que se guardaram (momentos).

Que se tornaram cinzas, e ardendo aos poucos

não sufocaram as chamas vermelhas.

Agora, a poesia está no ar como as palavras.

Podem ser palavras esquecidas na ponta da língua,

da boca pra fora, do peito adentro...

Isso, quando não fazem o tempo parar.

Palavras cruzadas que nunca se encontrarão.

Em lembretes e lembranças,

há aquelas que me pegam

e há aquelas que deixo escapar por entre os dedos.

Deixam de cumprir pena e tinta.

Outras, se arriscam num paiol de pólvora.

Outras, correm o risco de não dizer nada

e se calam para sempre com o passado e seus presentes

(futuros empoeirados de gaveta).

Da mina do lápis pode sair riqueza.

Da carga pesada pode sair alívio,

o início e o fim de dentro de uma caneta. 

 

 

© Daniel Conrade, 2011.

 

--

 

 

ARTISTA

 

Artista vira o tempo.

O tempo vira pó

na mão sobre a tinta.

 

O tempo leva, artista...

O pó vira o tempo

nos poros entre a tinta.

 

Ardor dentro de ti é Arte!

Solta ou em seus mínimos detalhes.

Tua atenção é artífice e distinta,

tua paixão é artesiana e arterial.

Haste que liga chão e céu,

assusta e atrai em seu contraste.

Onde as cores opostas trocam de posto.

São intensas em seus limites

como mão e pincel,

lápis e papel,

lama e lírio.

 

Tens razão, Leonardo*:

“Onde há a sensibilidade, é mais forte o martírio.” *

 

 

© Daniel Conrade, 2010.

* Frase de Leonardo da Vinci

 

--

 

 

LAVRA

                        

Últimos poemas... Primeiros passos.

O papel é plano (algo concreto).

Construir a letra é plantar,

cresce devagar e ultrapassa o teto.

Os frutos podem ser mais doces

se forem colhidos das raízes das palavras,

ou, podem não ter gosto algum                       

se quem escreve não tiver a alma lavrada.

 

 

© Daniel Conrade, 2011.

 

--

 

 

MILAGRE

 

Sobre um cavalete, pode-se cavalgar,

ir longe, atravessar o continente.

Sobre uma tela, pode-se assistir o passado

e, ao mesmo tempo, prevê-lo.

Podem-se riscar os medos

e amar sem risco.

Usar a vida ou a morte como modelo.

 

Pode-se fazer milagre.

Fazer amor.

Transformar tinta em água,

água em vinho.

Soprar vida em uma natureza-morta,

ou, simplesmente,

inspirar-se nela ainda viva.

 

 

© Daniel Conrade, 2011.

 

 

 

 

 

 

POESIA

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